DICAS

Manual dá dicas para quem quer aprimorar a escrita

Allan Nascimento
Allan Nascimento
Publicado em 28/11/2017 às 17:55
Confira entrevista com o autor do livro "Tirando de letra: orientações simples e práticas para escrever bem"
Confira entrevista com o autor do livro "Tirando de letra: orientações simples e práticas para escrever bem" FOTO: Confira entrevista com o autor do livro "Tirando de letra: orientações simples e práticas para escrever bem"

Escrever bem não é uma característica exclusiva de alguns grupos de pessoas. Os professores Chico Moura e Wilma Moura, com anos de experiência na sala de aula, estão entre aqueles que confirmam a tese de que todos estão aptos a desenvolver a escrita. Para isso, a dupla lançou o livro Tirando de letra: orientações simples e práticas para escrever bem (Companhia das Letras, R$ 44,90), um manual que dá dicas para quem aprimorar a arte de dissertar.

Mesmo que a temporada de vestibulares já esteja chegando ao fim, é uma obra que pode ser útil para aqueles que vão ingressar no ensino superior e também para quem ainda vai se preparar para as provas do ano que vem. Em entrevista ao blog, eles comentam alguns aspectos abordados no livro, refletem sobre os métodos tradicionais de ensino no País, a falta de tradição de manuais de escrita no Brasil (tão famosos em outros países), entre outros tópicos.

Confira abaixo a íntegra da entrevista:

1 - No início da nossa vida estudantil, temos dois primeiros desafios: aprender a ler e aprender a escrever nossos nomes. Diferentemente de vários conteúdos, a escrita é algo que nos acompanha em todos os momentos da vida de estudante. O que vocês consideram como falha de nossa educação para que 38% dos alunos do ensino superior brasileiro (números do Inaf) tenham dificuldades para escrever?

CHICO MOURA E WILMA MOURA - São várias as causas, e de fundo muito complexo, que têm a ver com as políticas educacionais implantadas no país há décadas. Não dá nem para afirmar o que vem primeiro: se a má formação dos professores, a falta de incentivo às carreiras ligadas à educação, a falta de recursos nas escolas, e por aí vai. Não existe uma continuidade metodológica que dê conta de objetivos a longo prazo. Mudam os governos, mudam as políticas, métodos antigos são demonizados e excluídos, não há preparo suficiente para aplicar os modernos e quem sofre as consequências são os alunos. Assuntos que são eminentemnte de cunho educacional são contaminados por interesses políticos, e os documentos norteadores da política educacional no país acabam servindo mais a crenças e ideologias que passam ao largo dos interesses de caráter puramente educativo. Haja vista as discussões intermináveis sobre a Base Nacional Comum Curricular (BNCC).

O ensino da Língua Portuguesa, historicamente, tem sido centrado no estudo da gramática normativa, cujo domínio não garante a competência na escrita. É bem verdade que, os materiais didáticos produzidos nos últimos anos, apontam para outros caminhos, mas encontram, ainda, bastante resistência por parte dos professores de português.

Chico Moura e Wilma Moura

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2 - Vocês acham que as escolas estimulam a escrita de uma forma muito restrita, de um modo muito voltado para aquilo que o Enem e os vestibulares cobram? Se acham, qual o prejuízo que isso acarreta para a formação desses estudantes?

CHICO MOURA E WILMA MOURA - Sem dúvida. Desde o primeiro ano do Ensino Médio, os alunos são solicitados a escrever apenas textos dissertativos, bem nos moldes do Enem e de alguns vestibulares. Os próprios pais exercem pressão sobre as escolas para que “treinem” os alunos para essas provas. A função social da escrita é deixada de lado. Esquece-se de que a escrita não se limita ao preenchimento de 30 linhas sobre um determinado tema para passar na prova. Ela faz parte do nosso cotidiano, principalmente no profissional. É preciso escrever relátorios, emails, resumos de reuniões, textos para apresentação em seminários, convenções, artigos científicos, para citar apenas alguns exemplos. Nesse sentido, a formação do estudante fica aquém do desejado.  

3 - Muitos leitores do nosso blog são estudantes que vão fazer o Enem. No livro, ler em voz alta e reler e reescrever os textos estão entre as dicas dadas para aprimorar a escrita. Numa situação em que o candidato tem pouco tempo para fazer um retorno aprofundado ao texto, além de não ter condições de fazer uma leitura em voz alta, qual a orientação de vocês para aprimorar a redação nestas circunstâncias?

CHICO MOURA E WILMA MOURA - As dicas que demos não são para serem empregadas, necessariamente, no momento da prova, e sim no período de preparação. Se o candidato tiver treino de ler em voz alta, por exemplo, numa releitura silenciosa conseguirá “ouvir” o som das palavras que escrever e perceber problemas de repetições, ecos, pontuação, concordâncias inadequadas, vocabulário impreciso. Por pouco tempo que se tenha, é indispensável reler o que foi escrito. Na fase de preparo, o candidato pode, mesmo, fazer várias simulações e cronometrar o tempo que demora para fazer o processo completo.

4 - O livro surge de um interesse maior das pessoas em desenvolver a escrita? Relacionam isso com o uso massivo das redes sociais?

CHICO MOURA E WILMA MOURA - Não dá para afirmar isso. No entanto, já se tornou lugar comum dizer que nunca se escreveu tanto como hoje, o que parece ser verdade. Mas essa escrita tem características muito particulares, de informalidade, concisão absoluta com uso abundante de abreviações, emoticons, linguagem cifrada, mesmo. Então, mais do que nunca é preciso que, em situação escolar, se pontue que esse tipo de escrita é adequado para comunicação nas redes, mas não pode ser utilizado em outras situações, que requerem uma escrita mais próxima da norma-padrão, em que não estão disponíveis recursos não verbais e em que o destinatário não faz parte do grupo de amigos.

5 - O que o fato de não termos a tradição de guias de escrita revela sobre nossa relação com a língua?

CHICO MOURA E WILMA MOURA - Revela a pouca importância que se dá ao assunto no Brasil. Mesmo muitas pessoas que se julgam proficientes em Língua Portuguesa raras vezes se dão conta das suas dificuldades na escrita. Temos  enormes patrulhas prontas para apontar infrações à norma-padrão, como vemos em abundância no Facebook, por exemplo. No entanto, essas mesmas pessoas podem, ao escreverem, até não errar na gramática, mas ter um texto pouco claro, incoerente, redundante, sem objetividade.

6 - Acreditam que quem não é conhecedor das regras gramaticais pode adquirir esse conhecimento a partir da prática da escrita?

CHICO MOURA E WILMA MOURA - Alguns conhecimentos são pré-requisitos. Ortografia, acentuação, por exemplo. Outros, como concordância, regência e até estrutura frasal têm mais a ver com o ambiente social. Crianças que crescem ouvindo as pessoas falarem de acordo com as normas introjetam esses conhecimentos sem que tenham consciência disso. O que podem não saber é a nomenclatura, mas empregam as regras naturalmente. Já pessoas provenientes de meios em que o falar não obedece ao padrão de prestígio têm mais dificuldade e precisam ser ensinadas.

Outros conhecimentos teóricos, como análise sintática, por exemplo, são dispensáveis. Há profissionais de texto que escrevem muito bem e que não dominam essa teoria. Adjunto adnominal, complemento nominal, oração subordinada, entre outras nomenclaturas, passam longe. Mas não separam o sujeito do verbo, nem o verbo dos seus complementos. A prática da escrita é fundamental, sem dar relevância a questões de caráter mais propriamente gramatical. Foi esse o caminho que escolhemos para o livro.

VEJA UM TRECHO DO LIVRO NESTE LINK.